22.9.05

Manuel Bandeira e a Modernidade

Manuel Bandeira é o poeta de Pasárgada, da utopia hedônico-existencial. É o poeta que convive com a limitação física severa que a própria vida lhe impõe, e portanto vê na sua poesia o "alhures" onde poderia viver plenamente e livre – liberto (sadio?). Bandeira incorpora os valores da modernidade num poetizar lúdico, solto, irreverente, em que o diálogo dialético com a tradição se consubstancia numa forma extrovertida, alegórica, folclórica e fabular – e poderíamos até dizer mesmo também "simples" de escrever poesia.

Manuel bandeira rompe dessa forma com as amarras formais da língua e estética do período pré-modernista, com o "lirismo de repartição pública", como diz. Desliga-se das estruturas tradicionais do verso. Entretanto não deixa de compor seus poemas com musicalidade e ritmo – tradicionais, imanentes ao fazer poético, sim -, mas de uma forma muito própria e característica (reminiscências da musicalidade e cadência presentes nos anos da sua infância?). O poeta Incorpora, nisso, uma materialidade do viver, do dia-a-dia, um coloquialismo daquele que, no seu dizer, teme que as ruas de sua infância venham a ser rebatizadas como ruas "Dr. Fulano de Tal", contrariamente à singeleza e essencialidade existencial por que eram conhecidas, num sinal de sua repulsa, sempre presente, pelo elitismo e formalismo burocrático sócio-cultural.

Penso que Bandeira legou à posteridade essa lição de uma poesia viva, alegre, corrente, compromissada com as suas raízes, mas raízes essenciais e ônticas do ser-no-mundo. Manuel Bandeira foi um poeta "em tempo integral". Viveu poesia, sonhou poesia, foi poesia. A modernidade teve dele o exemplo de uma poética total, mas não totalizante. Poética essencialmente fenomenológica, dos "fatos" da vida e percepções/especulações humanas. Bandeira, para todos nós: "Trouxe a extinta esperança/ Trouxe a perdida alegria".

Lucas Tenório