26.4.06

Fotografia

Imagem estacionada
num fio de horizonte
traçado de uma ponte
na luz dependurada

De um a outro lado
o passo da escassez
naquilo que se fez
turvo, surdo e calado

Esvoaçam pardais
que há muito já partiram
multifocais que viram
o que não se vê mais

Ainda a ponte alberga
senão dois polegares
percutindo os vagares
com uma ocular cega

Na pele, vê-se a íris
na irís arremedo
é na face levedo
e no intestino a bílis

Tempero do aparente
equilibrado óptico
variegado o pórtico
geracional de gente

Ausente numa praça
a ponte só encima
boneca de menina
em casulo de traça

Há quiçá um ancião
em pose terminal
perfume, um mineral
na mesma embarcação

Mas insiste o olhar
em ver além da inércia
o travo da solércia
a mancha linear

E vê a ponte estreita
o rio desidratado
o mineral calado
a âncora perfeita.

Lucas Tenório